VELHOS DE GUERRA
Kubelwagen Mk 82

A primeira referência a uma versão militar do VW ocorreu no dia 11 de abril de 1934, durante uma conferência entre representantes do governo nazista e da fábrica Porsche, a respeito do desenvolvimento do Volkswagen civil. Mas apenas em janeiro de 1938, o Departamento de Armas do Exército alemão apresentou ao Dr. Porsche as especificações para um veículo cross-country utilizando a plataforma VW.
Para atingir as especificações, os engenheiros da Porsche entenderam que uma carroceria leve, exigindo novos métodos de fabricação, deveria ser criada, pois não havia possibilidade de se retirar mais peso de um chassis VW (o mesmo do Fusca). A Porsche contratou a firma Trutz para desenhar a nova carroceria e o protótipo estava pronto em um mês. Foi denominado Tipo 62.
Os protótipos foram entregues ao exército em novembro de 1938 quando se iniciaram, imediatamente, as provas de campo. Naquela época havia a crença de que um veículo off-road precisava ter tração 4x4. Mas o pequeno VW 4x2 começou a provar que isto não era verdade. Hoje em dia, sabemos que os VW 4x2 (Gurgel, Bajas, Gaiolas, Jegue etc.) com seus semi-eixos oscilantes e suspensões independentes com amortecedores e barras de torção, são capazes de performances muito interessantes no fora-de-estrada, principalmente quando a alta velocidade de deslocamento é uma vantagem sobre os pesados e mais lentos 4x4 com seus eixos rígidos e molas em feixe.
Mas naquela época, esta suspensão era uma inovação técnica e o peso concentrado (motor e câmbio) sobre as rodas de tração, realmente faziam o Kdfwagen Tipo 62 funcionar em todo terreno. O primeiro protótipo tinha formas arredondadas, com recortes no lugar das portas (como usado no Jeep posteriormente), inspiradas nas linhas do VW. O exército pediu que a carroceria tivesse uma "aparência mais militar", surgindo, assim, o famoso veículo quadrado. Sua forma final foi apresentada ao público na Feira de Automóveis de Viena (Áustria) em 1939.
Antes de entrar em produção, o exército exigiu que as características off-road fossem melhoradas. Para isso a Porsche instalou os seguintes itens, que até hoje são desprezados e reinventados pelos construtores de Bajas, mas jamais chegando ao conjunto e à simplicidade conceitual original:
Semi-eixos tipo pórtico com caixas de redução como as das Kombis antigas (1961); Ponteiras de eixo rebaixadas na dianteira; Rodas de aro 16 com pneus mais altos; Diferencial LSD (Limited Slip Diferential - autoblocante); Amortecedor de direção.
Os semi-eixos pórtico, ponteiras rebaixadas e pneus altos elevaram o Kubelwagen do solo mais 5 cm. O amortecedor de direção, que não era usado em nenhum veículo da época, foi criado para aumentar o conforto devido a alta velocidade em terreno acidentado. O autoblocante é a solução óbvia para um 4x2 que tira uma das rodas do chão ou pode patinar: a força do motor vai para a outra roda. Ah, nenhum VW a ar moderno tem o jamais teve LSD original de fábrica. Alguns foram feitos para corrida em autódromo.
As caixas de redução permitiram aproveitar melhor a potência do pequeno e econômico motor de 985 cc. A melhoria da tração não significou diminuição no desempenho pois o Kdf VW chegava aos 80 km/h.
Em dezembro de 1939, após a invasão da Polônia, o Alto comando alemão aceitou as duas primeiras unidades modificadas sob a denominação de VW Tipo 82. No começo de 1940 o Tipo 82 foi testado em condições de inverno contra outros veículos 4x4 do exército alemão (hei, tire da cabeça que antes do Jeep 42 ninguém usava veículos 4x4, 6x4 e 6x6...). O desempenho na neve e no gelo foi surpreendente. Quando se resolveu equipar o Tipo 82 com correntes nas rodas traseiras ele superou todos os 4x4 mais pesados. Com o inverno surgiram algumas surpresas: (1) o motor a ar VW simplesmente funcionava pois a água do radiador (que não possuía) não congelava, mas (2) oficiais encarregados do teste reclamaram quanto a falta de aquecimento. Isso só foi resolvido muitos anos depois com as famosas caixas de ar quente do Fusca.
Do inverno para o Norte da África onde foram conduzidos os testes "tropicais", nada detinha o Tipo 82, nem mesmo a areia fina ou o forte calor, que desta vez não fervia a água do radiador (que não possuía). Pense bem: um veículo para deserto que não consome água! Que mais pode-se pedir? Ao final de 1940, mil unidades do Tipo 82 tinham saído das linhas de montagem. Poucos viram ação na França, mas na Campanha do Norte da África, eram um presença constante. Em 1941 a fábrica VW de Wolfsburg estava em plena capacidade produzindo o Tipo 82 em 4 configurações básicas: para passageiros com 4 lugares (a maior produção) para reconhecimento com 4 lugares para transporte de uma maca com 2 lugares central de rádio com 3 lugares e um potente transmissor de 50 watts
Pelo ano de 1941 o Kubelwagen era o preferido sempre que as condições eram ruins ou piores ainda. Nas geladas estepes russas, o Tipo 82, muitas vezes era o único veículo que continuava a andar devido a sua refrigeração a ar. Quando houve o primeiro degelo e a lama tomou conta de tudo, o peso concentrado atrás o diferencial autoblocante, a altura livre e o fundo plano, fizeram a diferença permitindo superar áreas intransponíveis até mesmo para os 4x4. E se atola-se de vez, seu baixo peso e, novamente o fundo plano permitiam que fosse rapidamente posto para fora do atoleiro pela força de sua tripulação. Para os jipeiros que nunca tiveram muito contato com Bajas, sempre é mais rápido umas 4 ou 6 pessoas levantarem o carrinho e tirarem do atoleiro do que guinchar ou tomar outra atitude...
No Norte da África, quando as temperaturas chegavam ao ponto de fritar os ovos (de galinha) nas chapas das carrocerias, O Tipo 82 continuava em frente. Sua autonomia era a maior entre todos os veículos em combate na região. Além do tanque de 10,5 galões, podia levar mais 2 camburões. Já viu a foto? Os Kubels usados no deserto possuíam pneus "dunne-buggy" nas 4 rodas, de baixa pressão, derivados de pneus de avião. Simplesmente deslizavam pelas dunas... Mas como conceitos simples e burocracia militar nunca se dão bem, várias das 500 unidades especiais para o Afrika Korps, foram parar na frente russa onde deve ter sido um desespero total andar na lama com aqueles pneus slick! Nessa época uma divisão Panzer possuía 29 Tipo 82 alocados permanentemente.
Em novembro de 1942, o Exército Americano testou um Tipo 82 capturado na batalha de El Alamein. O resultado do testes foi: "A experiência de combate demonstra que o veículo é de fácil manutenção, econômico para operar, de construção resistente e de fabricação barata. Era mais rápido que o Jeep e tinha espaço para quatro passageiros". Os dados técnicos estão na tabela.

A primeira grande modificação do Tipo 82 veio em março de 1943 quando o motor de 985 cc foi substituído pelo de 1131 cc usado no Schwimmwagen (assunto do mês que vêm). Outras mudanças vieram na forma de um novo painel de instrumentos e nos pára-lamas soldados à carroceria, simplesmente porque um monte de fábricas de parafusos forma bombardeadas pelos aliados.
Alguns protótipos foram desenvolvidos tanto pelo Dr. Porsche como por outras unidades militares. Um deles foi um 4x4 usando a mecânica do Schwimmwagen mas com bloqueio de ambos os diferenciais. Nenhum sobrou para contar a história... Como o 4x2 tinha performance equivalente a do Jeep (que não tinha diferenciais bloqueáveis) é provável que o 4x4 fosse bem superior ao Jeep. Mas aguardem, após o Schwimmwagen vem uma matéria sobre a evolução desses protótipo 4x4! Outro foi uma ambulância com teto rígido. Foram ainda tentadas uma versão meia lagarta e outra com rodas de trem para uso em vias férreas. Um dos desenhos que certamente teria feito sucesso mas nunca foi construído era com blindagem leve, entre eixos reduzido em 29 polegadas, capacidade para 3 passageiros e suporte para uma metralhadora dupla.
Durante a guerra, foram produzidos mais de 55 mil Kubelwagens Tipo 82 além de uns 15 mil Schwimmwagens. Mas o custo baixo de produção teve um alto preço. O Dr. Porsche não recusou que fosse usado o trabalho escravo nas plantas de Wolfsburg. Milhares de prisioneiros: franceses, poloneses, holandeses, belgas, russos e judeus forma enviados para os campos de trabalho na região da fábrica. Pelo menos 11 mil encontraram a morte nas linhas de produção onde eram submetidos a jornadas de trabalho estendidas, recebendo pouquíssima alimentação e com péssimas condições para os períodos de repouso. Mesmo trabalhando nas fábricas, esses prisioneiros não eram poupados da brutalidade infligida pelos oficiais Nazistas e guardas da SS. Mas como em todas as histórias terríveis dos prisioneiros, vários conseguiram sobreviver devido a comida, roupas e remédios contrabandeados por técnicos e trabalhadores alemães das fábricas, mesmo correndo o risco, deles mesmo se tornarem prisioneiros.
No final da guerra, a fábrica de Wolfsburg foi destruída em 100 % pelos ataques aéreos, mas a história do Tipo 82 não terminou ali... Aguardem o VW Thing Tipo 181.
|